1. Contextualização Teórica Aprofundada
O Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) é um tributo municipal, previsto no artigo 156, inciso II, da Constituição Federal, que incide sobre a transmissão entre vivos , a título oneroso, de bens imóveis ou direitos reais sobre eles. No contexto de uma holding familiar, a questão da incidência do ITBI surge frequentemente durante a integralização de imóveis ao capital social da sociedade, um procedimento comum para a constituição desse tipo de estrutura. A análise da obrigatoriedade de pagamento do ITBI exige a interpretação conjunta da legislação tributária e das normas que regulam as sociedades no Direito Empresarial, considerando os princípios constitucionais da capacidade contributiva e da legalidade tributária.
2. Análise Sistemática do Tema
A resposta à pergunta “Tem que pagar ITBI na holding familiar?” depende do enquadramento jurídico da operação de integralização de bens imóveis ao capital social da holding. Abaixo, detalhamos os principais aspectos:
2.1. Regra Geral: Imunidade na Integralização de Imóveis
O artigo 36 do Código Tributário Nacional (CTN) estabelece que não incide o ITBI na transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de uma pessoa jurídica em realização de capital social, salvo se a atividade preponderante da sociedade para a compra e venda de imóveis, a locação ou o arrendamento mercantil. Essa imunidade é reforçada pelo artigo 156, § 2º, inciso I, da Constituição Federal, que exclui a incidência do ITBI como operações de integralização de capital, exceto nas hipóteses mencionadas.
Portanto, em uma holding familiar típica (holding pura), cuja atividade principal é a administração de participações societárias e não a exploração imobiliária, a transferência de imóveis para o capital social não gera ITBI. Essa imunidade visa evitar a tributação em operações que não configurem circulação econômica efetiva, mas apenas uma reorganização patrimonial.
2.2. Exceção: Atividade Preponderante Imobiliária
Se uma holding familiar para variações como uma sociedade com atividade preponderante no setor imobiliário — por exemplo, se mais de 50% de sua receita bruta proveniente da compra, venda ou locação de imóveis —, a imunidade não se aplica. Nesse caso, o ITBI incidirá sobre o valor dos imóveis integralizados, com alíquotas que variam entre 2% e 5%, conforme a legislação municipal. Em São Paulo, por exemplo, a Lei nº 11.154/1991 fixa uma alíquota em 2% para a maioria das transações.
2.3. Risco de Questionamento Fiscal
Mesmo em casos de imunidade, os municípios podem questionar a operação, especialmente se houver intenções de simulação ou desvio específico (ex.: constituição de holding apenas para evitar o ITBI em uma venda futura). O Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do RE 796.376 (Tema 796), fixou a tese de que a imunidade do ITBI na integralização de capital está condicionada à ausência de atividade imobiliária preponderante, mas não pode ser negada com base em presunções genéricas do Fisco.
2.4. Outras Implicações Tributárias
Embora o ITBI possa não ser devido, a integralização de imóveis pode gerar outras consequências fiscais, como a incidência do Imposto de Renda (IR) sobre eventual ganho de capital, caso o valor de mercado do imóvel supere o valor histórico registrado na declaração de bens do sócio (art. 23 da Lei nº 9.249/1995). Essa diferença, se tributada, é apurada no momento da integralização.
3. Aplicações Práticas com Exemplos
Considera uma família que constitui uma holding familiar para administrar um imóvel avaliado em R$ 2 milhões. O imóvel é integralizado ao capital social da holding, que tem como objeto social apenas a administração de participações societárias. Nesse caso, a operação é imune ao ITBI, e nenhum tributo municipal será devido. Contudo, se a mesma holding passar a locar o imóvel e essa atividade representar mais de 50% de sua receita, o Fisco municipal poderá exigir o ITBI retroativamente, aplicando uma alíquota de 2% (R$ 40.000,00, em São Paulo).
Outro exemplo é o de uma holding que integraliza um imóvel com valor histórico de R$ 1 milhão, mas cujo valor de mercado é de R$ 2 milhões. Embora o ITBI não seja devido, o ganho de capital de R$ 1 milhão pode ser tributado pelo IR à alíquota de 15% (R$ 150.000,00), caso não se opte pela avaliação a valor histórico.
4. Referências à Legislação Atual
- Constituição Federal (1988) : Art. 156, § 2º, inciso I (imunidade do ITBI na integralização de capital).
- Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966) : Art. 36 (exclusão do ITBI em operações de capital social).
- Lei nº 9.249/1995 : Art. 23 (tributação do ganho de capital na integralização de bens).
- Jurisprudência : RE 796.376 (STF), que fixa a interpretação da imunidade do ITBI.
5. Conclusões Fundamentadas
Em regra, não há obrigatoriedade de pagamento de ITBI na constituição de uma holding familiar, visto que a sociedade não tem como atividade preponderante a exploração imobiliária. Essa imunidade, prevista na Constituição e no CTN, visa facilitar a reorganização patrimonial sem onerar o contribuinte. Contudo, a operação deve ser cuidadosamente planejada para evitar questionamentos fiscais, especialmente em relação à atividade da holding e à eventual tributação de ganhos de capital. A análise técnica, com suporte jurídico e contábil, é essencial para garantir a conformidade e maximizar os benefícios da estrutura, alinhando-se aos princípios do Direito Empresarial e da eficiência tributária.